Mecedora é uma palavra espanhola que designa a cadeira de balanço individual. Mas na mecedora feita por Beth Moysés, tão estreita, nenhuma pessoa é capaz de sentar-se.A cadeira, desprovida de sua utilidade original, lembraremotamente os ready mades de Marcel Duchamp, na medida em que é um objeto destituído da sua função e elevado à categoria de objeto de arte em um novo entrelaçamento de sensibilidades e significados. Remotamente, porque a mecedora de Beth Moysés é um objeto artesanal criado pela própria artista, cuja dissociação entre o que deveria ser, à primeira vista, e o que é, o é inerente à forma construída pela artista e não depende do contexto. Onde quer que esteja a cadeira, nenhum senta-se nela. Ninguém balança. À primeira vista,porque logo percebe-se a estreiteza do assento e do encosto e o que deveria ser, não é. E o que é, o é na ausência a que o próprio objeto remete, na inerência da sua forma-materialidade: ausência de espaço, para abrigar um corpo. Ausência de um corpo, que nela seria capaz de ritmo. Antes. Durante. Depois. Ausência, portanto, de Cronos. A transformação da mecedora lembra mais um objeto surreal, nascido da linguagem dos sonhos. Um objeto caído da super realidade do sonho sobre a micro realidade da terra, no estranho mundo das funcionalidades.A mecedora da Beth Moysés nasceu como um objeto que abriu mão de ser para fazer-se signo, radicalmente linguagem. Um estranho signo que nos obriga a escorregarnas suas margens. Um signo que escorrega, ele mesmo, no abismo. E para ele nos empurra. Para sobreviver a este abismo, é preciso abrir mão de querer ver, em tudo,relações de função. É preciso conectar com outra dimensão espaço-temporal. Talvez no espaço-tempo da memória, que invade o momento. Talvez no espaço-tempo da utopia do futuro, que modela o presente. Quem sabe, noespaço-tempo do acaso, que suspende o ritmo sucessivo. Kairós. Não é que o tempo não suceda mais nos instantes de antes, durante e depois no ritmo das cadeiras de balanço, isso sempre será possível nas tantas mecedorasque tem por aí, abrigando os corpos que se transformam sobre a terra. Não na da Beth. É que ela pertence a um outro tempo.